Paradoxo do mercado de trabalho no Brasil em 2025?

Por on 15/12/2025

O que mais se ouve é que nesse ano de 2025 já há sinais claros de que estamos adentrando E. Normalmente saltos desse tipo tendem a provocar consequências profundas no modo de vida das pessoas. Para melhor ou para pior.

No Brasil, os sinais de forte mudança no mercado de trabalho já se fazem evidentes nesses últimos 5 anos. A título de ilustração, veja que os ônibus municipais trafegam sem trocadores; os bancos “evitam trabalhar com dinheiro” e seguem fechando agências em ritmo frenético; as lojas físicas diminuindo, pois os consumidores compram cada vez mais pela Internet; os tradicionais taxis encolhendo, e o transporte por aplicativo só crescendo; as empresas, consultórios médicos e universidades funcionando cada vez mais pela Internet e, com isso, reduzindo drasticamente os seus serviços de apoio; os moradores de rua e a violência só aumentando nos grandes centros urbanos do país.

Por outro lado, os indicadores do mercado de trabalho no Brasil parecem evidenciar que em 2025 vivemos uma situação de continuidade conjuntural com viés positivo, na contramão dessas mudanças disruptivas que estamos presenciando, de destruição de muitos postos de trabalho mais do que a criação de novos.  Senão, vejamos a evolução recente de alguns desses indicadores, segundo o IBGE / PNAD Contínua.

1 – A taxa do desemprego aberto mede a relação percentual entre os desocupados (pessoas que não trabalham e estão procurando trabalho de forma ativa) e a Força de trabalho (Pessoas com 14 anos ou mais de idade que estão disponíveis para o mercado de trabalho, na condição de Ocupados ou Desocupados). 

Essa taxa, que era de 12,2% em 2018, atingiu o auge em 2020 e 2021 (na casa dos 14%) com a crise da Covid, e de lá para cá vem caindo direto, chegando a 7,8% (2023), 6,6% (2024) e 5,9% (estimativa 2025).

 Como explicar essa taxa de desemprego tão baixa em 2025, a menor desde 2012, quando teve início a nova série histórica do IBGE depois da revisão metodológica?

2 – Fui verificar, então, a taxa de subutilização da força de trabalho nesse período. Uma possibilidade seria a de que o desemprego aberto estivesse em queda, porém a taxa de subutilização da força de trabalho estivesse crescendo e, dessa forma, mascarando aquela boa tendência do desemprego. Mas tal possibilidade não se verificou.

O grau de subutilização da força de trabalho é medido pela relação percentual entre [os desocupados + subocupados por insuficiência de horas semanais trabalhadas (menos de 40 horas, porém disponíveis para trabalharem mais) + força de trabalho potencial (pessoas em desalento + pessoas que não procuraram trabalho mas que continuam disponíveis)] no numerador; e a Força de trabalho no denominador

Como mostra o gráfico abaixo, a taxa de subutilização da força de trabalho veio em rota declinante desde 2018 (24,7%) para 20,8% (2022), e 13,9% (2025 / trim.agosto-outubro).

3 – Outra hipótese poderia ser que, para manter os níveis razoáveis de ocupação, as pessoas poderiam estar aceitando trabalhar em troca de remuneração mais baixa. Fui, então, verificar a evolução do rendimento médio do trabalho das pessoas ocupadas no país. Como mostra o gráfico abaixo essa hipótese também não se verificou: o rendimento médio do trabalho só caiu em 2021 por conta da crise da Covid, para logo em seguida (2022) retomar a curva ascendente de antes.

Vale lembrar que benefícios de programas sociais (como bolsa-família ou Benefícios de Prestação Continuada) não são computados como rendimentos do trabalho. Eles são incluídos, sim, em “Outras fontes de rendimento” (junto com aposentadorias, aluguéis, doações, etc..) quando o IBGE trata do rendimento domiciliar.

4 –   Por último, quis verificar o que estava ocorrendo com a distribuição dos rendimentos do trabalho das pessoas ocupadas.

Também aqui o que pude constatar é que o índice de Gini estimado para 2025 (0,505) está no seu patamar mais baixo desde o início da série do IBGE em 2012 (0,508), tendo atingido o pico em 2021 (0,554) no auge da crise da Covid. Vale lembrar que quanto mais baixo o índice de Gini (ou próximo de zero), melhor é a distribuição de renda; e quanto mais elevado (ou próximo de 1), pior é a distribuição de renda.

Também a distribuição da massa dos rendimentos do trabalho por decis da população ocupada corrobora nessa direção positiva de redução na desigualdade da renda. O gráfico abaixo mostra que, de 2021 para 2025, a participação percentual no total dos rendimentos dos 50% ocupados com menores rendimentos subiu de 12,2% para 15,1%, enquanto esse percentual para os 10% ocupados com maiores rendimentos seguiu siginificativa trajetória de queda, de 57,2% para 50,3%.  

Brasil – Distribuição da massa total de rendimento do trabalho das Pessoas Ocupadas, por decis

AFINAL, estamos vivendo no Brasil um paradoxo do mercado de trabalho? Parece que sim. Pois, por um lado, os indicadores do mercado de trabalho nos passam tranquilidade, sinalizando para uma trajetória conjuntural positiva. Por outro lado, estamos apreensivos vivenciando uma realidade meio caótica ao nosso redor, com profundas transformações nos modos de produzir, consumir e de comunicar, e com muitos postos de trabalho sendo destruídos. Ou em via de serem cortados, pois se tornaram supérfluos ou desnecessários. Novos postos começando a surgir com um outro rol de competências, mais exigentes e, daí, com risco de retrocesso nos indicadores de inclusão e justiça social. E, assim, novos desafios para a atuação do Terceiro Setor.

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MARIA CECÍLIA PRATES RODRIGUES
Rio de Janeiro - Brasil

Maria Cecília é economista e mestre em economia pela UFMG, e doutora em administração pela FGV /Ebape (RJ). A área social sempre foi o foco de suas pesquisas durante o período em que esteve como pesquisadora na FGV , e depois em seus trabalhos de monitoria, consultoria, pesquisa e voluntariado.