Indicadores ESG: padronização e comparabilidade

Por on 07/09/2021

Já escrevi bastante sobre os indicadores ESG – no Brasil  a sigla em inglês é que se tornou conhecida (Environmental, Social and Governance). Na realidade, o conceito ESG é um desdobramento do conceito da Responsabilidade Social Corporativa (RSC), que surge no final da década 1980. Em última instância tratou-se da ampliação do foco da empresa, não mais restrito à dimensão financeira e dos acionistas, mas ampliado para os aspectos sociais (todos os públicos envolvidos), ambientais e de governança.

Durante quase 50 anos, até por volta de 2018-2020, essa ampliação de foco teve caráter voluntário e de empresa boa cidadã. Nesse período, a prática ficou longe de corresponder à teoria. Ocorre que não atuar como  empresa cidadã  (que cuida, de fato, de todos os seus públicos) passou a afetar a lucratividade, e acabou empurrando os acionistas e o setor financeiro como um todo a abraçarem a causa da empresa ESG. Dessa vez, os estímulos são mais fortes para fazerem a prática corporativa corresponder à teoria.

O grande desafio do momento  é o de como medir os critérios ESG. Como padronizar as métricas? Como comparar desempenhos de empresas em setores tão diferentes, e poder afirmar, por exemplo, que o desempenho em ESG de um banco é melhor / pior do que o de uma mineradora?  Há mesmo sentido e necessidade de comparações desse tipo?

Muitos estudos e trabalhos têm sido publicados sobre essa questão. Só nesse final de semana, li duas matérias curtas e provocativas: Falta de padrões dificulta avaliação de dados ESG   e  CEO da MSCI: Pressão para padronizar as classificações em ESG está mal colocada 

A solução para esse desafio de avaliação do desempenho em ESG das empresas não pode pretender trazer para o Brasil os padrões internacionais já validados, como por exemplo o GRI (Global Reporting Initiative). Por uma razão principal simples: pouquíssimas empresas no país conseguiriam arcar com os custos de tais medições.

Além disso, tem que ser analisado, para cada tipo e tamanho de empresa, o que faz sentido (ou é relevante) ser avaliado em termos de ESG.  De forma alguma quer isso significar que a empresa só deveria  avaliar e mostrar em ESG o que está bonito e o que lhe convém em cada momento. O ponto é que toda empresa deveria ser cobrada por seu desempenho ESG, em função das especificidades do seu ramo de negócio, do seu tamanho e de sua localização. Deveriam ser estipuladas faixas de baseline desejáveis para o desempenho em ESG por segmentos de empresas.

Em caráter preliminar e para suscitar novas discussões, eu tenderia a propor o seguinte   padrão de desempenho ESG para as empresas no Brasil.

  1. Considerando os setores de agropecuária, indústria, serviços  (privado e público) dada a realidade brasileira, definir subsetores em função de uma tipologia de impacto, considerando a relevância dos efeitos de suas ações com  relação às dimensões econômica, social  (públicos envolvidos), ambiental e de governança.
  2. Para cada um dos subsetores acima, identificar e selecionar os indicadores relevantes para mensurar ESG nas 4 dimensões. Interessante conhecer o que já existe na literatura internacional. O importante é que sejam poucos indicadores, e relevantes.
  3. Adquirida essa sensibilidade com os indicadores (ou métricas) setoriais, identificar dentro de cada subsetor se há e quais são os segmentos de empresas em função de sua capacidade de impacto, considerando variáveis tais como tamanho da empresa, tecnologia, localização, dentre outras. Os segmentos de empresas são grupos de empresas (dentro de cada subsetor) com certa semelhança  no padrão de performance. 
  4. Para cada um dos segmentos de empresas, tomando por base os indicadores já selecionados no item 2, verificar se o filtro de indicadoressegue válido ou precisa de adaptação.
  5. Definir  as faixas de resultadospara cada indicador (limite mínimo e limite superior) que são esperadas por segmento de empresas.  Essas faixas de resultado poderão ser atualizadas com a evolução dos desempenhos e desafios.
  6. Essas faixas de resultado, identificadas por segmento de empresas, vão permitir  classificar as empresas segundo o seu desempenho em ESG e acompanhar a sua evolução no subsetor.  

Evidentemente essa ideia de um padrão para a classificação do desempenho ESG só será útil, em termos de provocar mudança real no comportamento ESG das empresas, se ele se tornar um referencial amplamente adotado no Brasil. Se permanecer no campo da medição voluntária e restrita a poucas grandes empresas, muito pouco se avançará. 

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    Prof. João Luís Menezes

    14/11/2021

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MARIA CECÍLIA PRATES RODRIGUES
Rio de Janeiro - Brasil

Maria Cecília é economista e mestre em economia pela UFMG, e doutora em administração pela FGV /Ebape (RJ). A área social sempre foi o foco de suas pesquisas durante o período em que esteve como pesquisadora na FGV , e depois em seus trabalhos de monitoria, consultoria, pesquisa e voluntariado.