Sábado cedo é hora da minha corrida matinal na pista Claudio Coutinho, que rodeia o Morro da Urca (RJ). Área tranquila e muito bonita, e por isto sempre bastante visitada pelos próprios cariocas e turistas. Porém, nesse último sábado de julho, o dia amanheceu chuvoso, nublado, branco e ventando bastante… como mostra a foto acima. Vou ou não vou correr? Percebi que me vi pensando como uma empreendedora social…..
Era a decisão que eu tinha que tomar de imediato, ou então fazer outra programação. Se eu tomasse a decisão de correr naquele momento, isso teria como resultados imediatos uma paz interior inspiradora durante a corrida, uma sensação agradável e recompensadora de “missão cumprida” no pós-corrida, sem falar no impacto positivo sobre a minha saúde.
Porém, correr naquele momento teria alguns riscos, e eu teria que “pesar” as chances e gravidades de ocorrência deles, tais como:
- molhar e sujar o tênis nas poças de água que se formam pelo caminho;
- tropeçar e cair na pista escorregadia;
- ser assaltada ou ameaçada, porque a pista tende a ficar vazia e erma em dias chuvosos.
Avaliei prós e contras da decisão, e decidi sair para correr naquela manhã chuvosa. Durante os 40 minutos em que estive lá, não encontrei ninguém…. Fui a única pessoa naquele lugar lindo e bucólico, situação raríssima de ocorrer, pois lá estão sempre muitos visitantes e atletas a qualquer hora do dia! Ao final daquela corrida, a sensação dessa vez foi excepcional: além dos seus resultados positivos habituais, tinha conseguido vivenciar as belezas da Pista Claudio Coutinho, referência internacional, em um de seus raros momentos de completa paz.
Fazendo um paralelo, assim é a vida dos empreendedores sociais em organizações do terceiro setor. Sobretudo daqueles que estão começando, que alimentam um sonho grande de transformar vidas e de dar oportunidades para pessoas vivendo em vulnerabilidade. Aí, em ambiente de escassez de recursos e de apoiadores (que ainda precisam ser duramente conquistados!), as consequências do erro podem ter gravidade ainda maior do que para os empreendedores já estabilizados, a ponto de abortar os seus empreendimentos nascentes.
Alguns erros típicos que vejo sendo cometidos por esses empreendedores são: (i) investir na aquisição prematura de equipamentos e espaços antes de consolidar uma rede mínima de usuários; (ii) crescer a oferta dos serviços sociais para além da capacidade de cuidar devidamente da qualidade desses serviços; e (iii) buscar auto-remuneração superior (ou incoerente) ao perfil das demais despesas da organização. Em particular nesse último caso, é sempre um momento arriscado quando o empreendedor social toma a decisão de não mais atuar como voluntário em sua própria organização (que é quando ainda tem que exercer atividade em paralelo para ter garantia de renda) e passar a ser integralmente mantido por ela.
Não estou advogando em prol da cautela extrema e a não correr riscos. Pelo contrário, no caso das organizações sem fins lucrativos, para elas serem bem-sucedidas e alcançarem os bons resultados almejados, é preciso, sim, correr riscos. Mas, de forma criteriosa. Ou seja, cada decisão a ser tomada deve ser precedida por duas perguntas básicas: se eu tomar tal decisão, quais as possibilidades e gravidades envolvidas se der errado? Mas, por outro lado, quais as possibilidades e benefícios se der certo?
Essas duas perguntas básicas valem não apenas para as tomadas de decisão dos empreendedores sociais do setor não-lucrativo, como também para aqueles do setor lucrativo. Aliás, como vimos, elas servem para nos ajudar em qualquer tipo de decisão em nossas vidas, até mesmo para as mais triviais sobre se devemos ir correr (ou não) em uma manhã chuvosa.