FACEBOOK: o grande dilema

Por on 29/10/2021

Recente caso com a empresa Facebook, que a partir de hoje passou a se chamar Meta, ilustra um dos grandes dilemas atuais dos negócios de impacto. Considerada entre as empresas mais valiosas do mundo, a empresa Facebook se viu, nesse 2º semestre de 2021, frente a uma forte crise de opinião pública, capaz de destruir de um único golpe todo o valor da empresa – presente e futuro. E por quê?

Empresa com impacto: Missão social e Retorno Financeiro

A empresa Facebook  é uma das startups mais bem sucedidas do Vale do Silício (Califórnia, EUA).  Tudo começou em 2004, com a intenção de ser uma “rede social” entre colegas da Universidade de Harvard, caso do jovem  Mark Zuckerberg, um dos quatro fundadores e CEO da companhia.  Desde o início, a empresa já tinha a sua missão explicitada de forma muito clara: “dar às pessoas o poder de aproximar comunidades e aproximar o mundo”. Ou seja, tecnologia e inovação em prol de uma missão social.

De fato, quantos milhões de pessoas já não foram realmente beneficiadas pela empresa Facebook desde então? Famílias e amigos, separados pela distância física, tendo a oportunidade de se (re)encontrarem como se juntos estivessem. Grupos de estudos trocando e somando suas experiências e avanços, apesar de  realizados em diferentes cantos do Planeta.  Empreendedores ampliando sobremaneira a sua base de clientes e públicos em geral.

Assim, num crescendo, a empresa Facebook foi rapidamente ganhando escala e conseguindo conectar cada vez mais pessoas espalhadas mundo afora. Primeiro, através do (próprio) aplicativo Facebook, e depois outros recursos foram sendo desenvolvidos e/ou adquiridos como Whatsapp, Instagram, Messenger, Portal, Workplace,  Oculus.  Muitas dessas ferramentas podem ser acessadas gratuitamente – ou são serviços cobrados, no caso de grandes empresas.   Nesse ano de 2021, a Facebook está listado entre as 10 marcas mais valiosas do mundo (6º lugar), estimada em US$ 226,7 bilhões, com uma variação de 54% em relação ao ano passado.

Sem ter maior aprofundamento no estudo, tendo a afirmar que a empresa Facebook é, sim, uma empresa lucrativa com impacto.  Ela tem se guiado, desde o início, na direção de sua missão social, com impacto social significativo para a vida de milhões de pessoas e famílias. Basta dizer que, hoje em dia, é praticamente inconcebível a vida sem whatsapp e instagram.  Ademais, em se tratando de retorno financeiro, é um caso de sucesso inquestionável. 

O dilema:  Impacto X Retorno financeiro?

As plataformas da empresa Facebook usam algoritmos, que são capazes de identificar e aproximar grupos de pessoas, a partir de seus perfis e interesses semelhantes. Graças a esse recurso é que a empresa vem conseguindo expandir, numa velocidade exponencial,  as redes de contato (networking) em âmbito global. Ou seja, não apenas criando pontes entre pessoas que já se conhecem, mas sobretudo criando e fortalecendo os laços entre pessoas que ainda não se conhecem, mas que têm algo em comum. 

Porém, o que ocorre é que, para além dos impactos positivos do Facebook, começaram também a aparecer impactos negativos, entendidos como efeitos não-intencionais indesejados. Há, pelo menos, três tipos desses impactos negativos já detectados:

  • Sentimentos de ansiedade, depressão ou pensamentos suicidas que são gerados nos usuários, geralmente adolescentes, frente a situações de perfeição e felicidade que são mostradas nas redes;
  • Estimula a multiplicação de propagandas enganosas (clickbaits), valendo-se da curiosidade e emoção dos usuários;
  • Empodera a ação de líderes/ profissionais extremistas que espalham mensagens perigosas e de ódio, em grande escala.

Para os críticos da Facebook, desde 2018 a direção da empresa tinha conhecimento desses impactos negativos. Todavia, não alterou em nada a programação dos algoritmos (por uma programação mais segura),  porque sabia que isso acarretaria menos tempo dos usuários on-line e, portanto, queda no faturamento da empresa proveniente dos anunciantes.

Evidentemente que  se trata de um problema muito mais complexo do que o descrito acima, envolvendo vários tipos de soluções, a nível da sociedade como um todo e não apenas a nível da empresa: (a) Necessidade de maior regulamentação do Estado; (b) Investimento da Facebook em detecção de conteúdos indesejáveis via desenvolvimento do sistema de algoritmos e/ou “moderadores humanos”; (c) Investimento em educação e saúde das populações, para não serem presas fáceis dessas armadilhas; (d) Questões relacionadas à limitação das liberdades de expressão e privacidade das pessoas.

Porém, se a narrativa de acusação contra a Facebook é verdadeira, e se de fato a empresa não se mobilizou para combater os impactos negativos que ela gera, somos levados a inferir que, no caso específico dessa tomada de decisão, a (direção da) empresa Facebook priorizou o retorno econômico em detrimento dos seus impactos na vida das pessoas. 

CONCLUINDO, não há tomada de decisão neutra no dia a dia das empresas e das pessoas. Toda tomada de decisão implica em escolhas e, nessas escolhas, para além dos fatores racionais, o que acaba pesando (de verdade) são  os valores e a história de vida do decisor-chefe.  Importante lembrar disso quando a empresa estiver frente a novos dilemas entre impacto e retorno. Porque nem sempre a mudança de nome da companhia vai poder ajudar….

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MARIA CECÍLIA PRATES RODRIGUES
Rio de Janeiro - Brasil

Maria Cecília é economista e mestre em economia pela UFMG, e doutora em administração pela FGV /Ebape (RJ). A área social sempre foi o foco de suas pesquisas durante o período em que esteve como pesquisadora na FGV , e depois em seus trabalhos de monitoria, consultoria, pesquisa e voluntariado.